ardentia verba – 2


II – Frases que se perpetuam

Esqueço-me que as palavras também se materializam, que passam de um pensamento a um estado visível de transmissão. Quando são ditas, as palavras apenas passam à distancia que o som e o ar as permite transportar e são actos efémeros audíveis, completamente momentâneos e raramente reproduzíveis novamente na sua essência, timbre como são proferidos e conotação com a língua, a boca e os lábios o emitem.

Quando as palavras passam por uma caneta, uma máquina de escrever, um teclado, tomam outra alma, são já um compromisso materializado de um pensamento, ideia ou emoção. Podem ser lidas repetidamente e os seus significados circunscritos dissecados, pondo a nu toda a sua expressão e mensagem.

Mesmo que sejam destruídos o seus suportes, como o papel, ou estas pacatas páginas, essas palavras atingiram uma substância eternizada que se perpetua, sendo eterna mesmo que já não existente, pois ouve uma prova palpável da sua presença.
Essa marca de que as palavras são para todo o sempre fustiga hoje a minha leveza de escrever. Toda a ânsia e escassez de tempo com que matraqueio o teclado, não me dá a lucidez de transportar a clareza do que pretendo enviar numa simples mensagem.

Quando as minhas memórias e emoções são aqui depositadas não estão escritas na areia à espera de uma onda que as apague, nem estão só marcadas a canivete na cortiça do tronco de uma árvore. Essas memórias e emoções serão depositadas transportadas numa capsula do tempo, para sempre incorruptíveis num vácuo temporal. E quando é assim, deixa uma efeito semelhante a uma ponte para a eternidade e que depois de ser lançada não pode mais ser alterada, rectificada ou repensada, como a placa que viaja na sonda Pioneer 10 a 12,5 mil milhões de kilometros da Terra, uma mensagem da humanidade que muito provavelmente sobreviverá a extinção da humanidade e civilização que a concebeu.


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