2005

Quando o pico do calor chegou, assim como a época de incêndios, decidi tirar uns dias de férias para descanso dos meus ossos. Pretendia resolver uma data de assuntos burocráticos pendentes, mas a minha capacidade de organização e uma manifesta preguiça há muito adiada, apenas me permitiu realizar um punhado de tarefas agendadas há muito.

Uma das que me deu particular prazer, foi visitar a maninha e cunhado, conhecendo o seu rebento. Fiquei babado diga-se de passagem, mas quem não ficaria? Um sorriso lindo, pacifica de natureza, L., é a menina dos papas babados. Além da petiza, outra novidade era a nova casa, bem na baixa da minha cidade. Vista para os paços do concelho, em plena rua feliz. A baixa que está deserta durante a noite, acaba por ser um local aprazível. E se não fossem os ratos alados que invadem tudo e os gatos atrevidos, tudo pareceria como que se estivéssemos algures numa cidade verdadeiramente cosmopolita. Ao contrario das grandes cidades lusitanas, as pessoas de países bem organizados vivem nas próprias grandes cidades e não apenas na sua periferia.

Fiquei abismado com o trabalho de arquitectura e bom gosto, que a casa contém, assim como a inquilina do rés-do-chão, talvez a última pessoa que imaginaria encontrar nessa noite. Havia ali um je ne sais pas de Artes em Partes, e Maus Hábitos que me agradaram , pelo conforto e open air.

Os assuntos do Passado vieram em conversa corriqueira, mas agora mais nos aspecto saudosistas. O tempo acaba por acabar a frustração e revolta, para dar espaço apenas às boas memórias que valem a pena recordar. É bom reatar laços de amizade.

Rezam as lendas, que numa longínqua semana, vários cavaleiros da ordem do garfo e faca se sentaram á mesa, para um frugal repasto de fim de Julho.
Gratos pelo cair da noite na feira, o ar quente tornou-se suportável. Longas foram as conversas da nobre cortes, onde um porco bravo com castanhas deliciou os convivas.

Correu célere o delicioso vinho tinto, servido em canecas de barro, escorrendo pelas gargantas sempre secas dos convivas. Serenos e alegres deliciaram-se e alegraram-se na noite. Terminada a farta refeição, logo os cavaleiro partiram em demanda. Buscavam no meio da multidão, algum artigo por entre as tendas dos artificies que pudessem levar para os seus solares.

Mas eis que esta pequena aventura, rapidamente se tornou numa epopeia digna de ser cantada por todas os seríes de jograis por este reino fora. Os quatro cavaleiros mais bravos deparam-se inesperadamente com uma tenda com um precioso tesouro escondido iria maravilhar os seus olhos e gargantas. Tratava-se de um nêctar, uma ambrósia divina servida em pequenos copos esculpidos em madeira chamada Ginjinha.

Tratava-se de Ginjinha de óbidos, com um maravilhoso paladar a canela, como que irresistível ao palato mais exigente. Depois as lendas começam a divergir. Conta-se que dois cavaleiro se entusiasmaram tanto que tiveram como montada, uma linda burra chamada Luana. Conta-se também que os escudeiros que traziam a Luana graciosamente ajudaram a que a deliciosa ginjinha começasse lentamente a desaparecer das pipas. Conta-se também que os cavaleiros ao se verem confrontados por uma câmara de reportagem e ao saberem que se tratava da TVI se recusaram determinantemente a serem entrevistados por tão medíocre meio de informação.

Longa foi a noite e ainda amanhecia, quando exaustos, os cavaleiros prometeram não esquecer aqueles momentos medievais.

Todas essas cinzas que esvoaçam, queimam-me a alma. Tudo arde, tudo está queimado.
Parece que nada vai restar depois de o fumo passar, a não ser o negro onde estava o verde.

luna roja
y en la radio la precisa melodía
proyecta tus arpegios endiablados
viejo Jim Morrison
arqueas la cintura
la sensualidad de tus labios
y entre filtros de peyote
y vasos de aguardiente
te diriges peligrosamente
hacia el fin
– enciendes el cigarro
alzas la copa de vino
y brindas por ti, por Blake
Artaud, tus oscuros fantasmas –
la mirada extraviada
el seco gemido
nadie entiende el descarnado alarido
que parte el cielo en pedazos
la muerte traidora danzando
sobre tu cuerpo
la soledad desnuda en medio del escenario
el baile indio

el suicidio anunciado

entregando en cada concierto
tu más rotunda agonía
rey de los lagartos.

Estou politicamente desiludido. Raramente me perco em discussões políticas, nem tenho paciência para troca de apupos dogmáticos ou esgrima de argumentos ortodoxo-partidários. Isto não quer dizer que não me interesse pela política no sentido que os seus resultados têm consequências profundas na nossa vida, quer queiramos quer não.

Seguir as rixas políticas em Portugal foi sempre um segundo desporto nacional. Basta ler Eça e perceber que nos ultimos 120 anos pouca coisa se alterou na maneira de estar na política portuguesa. Nunca entendi porquê, mas isso está intrincado na cultura lusa, de forma quase doentia.

Acho que o tempo revela-nos muitas surpresas. A vida é feita de inúmeras etapas, mas que revelam um retorno cíclico de ambientes e envolventes. Apesar de mais velho (e quem sabe sábio), parece que volto a caminhar por caminhos já trilhados, mas tomando diferentes atalhos, em passos mais seguros.

Tal é o caso do retorno do Club Gourmet, que para muito espanto meu, assumiu uma forma que eu não seria capaz de imaginar. Questiono-me se o conceito de eterno retorno, não é mesmo verdade. Assumindo contornos diferentes reencontro-me em momentos de prazer pantagruélico. No último festival, apesar de sermos poucos mas muito bons, rapidamente o repasto se tornou uma agradável animação descontrolada, rematada pelo perigosissimo Rémy Martin que fez imensos estragos nas hostes.

Ainda surgiu um brinde irreverente, qual grito do Ipiranga, bastante unánime: o dinheiro não se leva para o caixão – sinal inequívoco que certos luxos são caros, mas que em certas alturas fazem sentido.

Já durava umas boas três horas, quando o paciente staff nos enxotou do restaurante, à porta do qual se pode assistir a uns bons e deploráveis momentos Kodak, incluindo a imagem surrealista de S. a debater-se convulsivamente no capôt de um Rolls-Royce. Mas esses fotogramas difusos fazem parte da mústica do Club Gourmet que de quando em quando, necessita de dar azo à sua excentricidade contida.

Dou por mim a usar a expressão latina sui generis como um martelo a cada meia dúzia de temas de conversa, mas nada mais natural de que ter os neurónios satisfeitos e preguiçosamente tocados, como num retorno a outros momentos históricos.

A história repete-se. Mas não na exactidão. Assim como as ”Bom-bokas” não voltarão a estar na moda, também nada se repete integralmente. Espero!!!

Mais um aniversário deste diário, faz-me pensar na sua longevidade e na sua razão de ser. A titulo de balanço, posso considerar que este espaço me proporcionou muitos bons momentos e alegrias, mas também uma resma de dissabores. Contudo, e pesando com cuidado os pratos da balança, creio que é razoável dizer que a vida deste meliante teve mais algum colorido graças ao psicotico.com.

Durante quatro anos, ele foi receptáculo de muitos momentos de felicidade ou desespero, um confidente subtil e também um campo para dar largas a algumas excentricidades.
Dando-lhe uma vista de olhos no seu passado (way back), para os tempos que o fenómeno de blogs era geek hardcore e não massificado como hoje, fico espantado na forma como a minha vida tem sido.

Parece-me bem polvilhada de alterações de percurso, apimentada com derrocadas alternadas com reconstruções. Junte-se umas pitadas de pacatez, dois dentes de excentricidade, e esperança q.b. . Depois leva-se a lume brando e depois serve-se a quente com dois raminhos de entusiasmo.

O Passado, as idas pendulares, a grande cidade/minha cidade, as tempestades, o clube groumet, as noites Kitten, o maralhal de iniciais para identificar as personagens, o enredo velado, os Damage report,os desabafos expresso, o anjo sem asas, as fotos, os poemas, as injecções de serotonina, as psicoses, a América do Sol, as letras, as músicas, os forcados amadores, a Vida, etc., hoje parecem-me recordações fantasiosas, mas que não deixam de ser uma lembrança real que está num expositor online. De mim próprio, para o próprio autor, uma ferramenta auxiliar de memória que me ajuda a perceber, os meus fracassos e êxitos, as minhas descobertas e os o meus erros.

E tudo cabe num backup de 1 megabyte. Uma simples diskette em que cabem partes dos últimos quatro anos da minha existência. Obrigado e parabéns.

Sou um evadido.
Logo que nasci
Fecharam-me em mim,
Ah, mas eu fugi.

Se a gente se cansa
Do mesmo lugar,
Do mesmo ser
Por que não se cansar?

Minha alma procura-me
Mas eu ando a monte,
Oxalá que ela
Nunca me encontre.

Ser um é cadeia,
Ser eu é não ser.
Viverei fugindo
Mas vivo a valer.

A Oeste repousa o mar, ciclicamente seguindo o passar das marés, ora calmo, ora bravo. Como num dos meus preferidos livros, éA Oeste nada de Novo , assim também retrato estes dias. Apesar de não haver notícias da frente Oeste, muito se passa nesta guerra esquecida e distante, tão próxima e tão pessoal. Dramas e vitórias intimistas se sucedem, sem alarido.

Gozo com satisfação o ambiente quente e momentos únicos em que a luminosidade, do amanhecer ou do fim de tarde, provoca cores únicas no cêu e no mar. Consegui aproveitar uma boa meia dúzia de vezes esses momentos excepcionais, onde talvez possa quase existir uma paz absoluta, numa praia deserta do entardecer.
A sós com as gaivotas, com a melodia infinita das ondas padecendo na areia, com um Sol já menos radioso, vou transportando-me para uma harmonia de calma interior que se me escapa durante o dia de labuta. São esses momentos que desvendam o véu que encobre o todo prazer de viver. Não trocaria isso por nenhum outro cenário, por nenhuma outra expectativa de existência.

Pergunto-me se não estou a descobrir uma espécie de verdade Zen, de reflectir na ausência de pensamentos, apenas levando a mente a apropriar-se e descobrir a realidade pura e simples que não vemos.

O vento tem imperado toda a semana, fustigando com fortes rajadas frias, os meus fins de tarde. Desta forma refugio-me um pouco no lar e não tenho aproveitado para dar asas à minha paixão pelo mar salgado, ou pela poeira que levanto em duas rodas. Além disso o último tombo em duas rodas tem ainda as suas repercussões, fazendo o meu tornozelo, algo semelhante a um balão que incha e desincha à mercê do calor.

Apesar da temperatura subir à noite, o meu ar condicionado natural obriga-me a agasalhos desmotivantes num Verão tão estranho. Agora tudo parece arder em volta da minha cidade, tornando o céu num azul baço e triste. O cheiro execrável do fumo aparece a cada esquina, fazendo um desconforto incomum das minhas fracas narinas.