Dias

O matrimónio pode até já não ser uma instituição sagrada, mas o seu simbolismo tradicional pode ser belo, em especial se os noivos comungarem de um amor genuíno. O casamento do D. foi extraordinariamente belo, requintado e espero que marque um inicio muito especial para um casal tão bonito.
Comi e bebi do melhor e dancei como nunca tinha dançado com a menina do belo vestido cor-de-rosa.

No ano que se completavam trinta edições, decidi-me a uma aventura política por cores que não são as minhas e ver pelos meus olhos a maior festa politizada em Portugal. Rumo a grande cidade e passando a grande ponte parecida com as notas de quinhentos, ladeado pela
Purpurina
e amigas e pelo fiel companheiro de armas.

Após o reboliço de acertar com o trajecto e arranjar o livre acesso a tenda num extenso aglomerado de cogumelos de pano que dava para perder de vista, eu, vosso excelentíssimo comentador de façanhas mais ou menos banais, dei-me por mim em plena festa da Quinta da Atalaia, qual pára-quedista ou agente infiltrado no covil do lobo. Dez minutos bastaram para perceber que a festa do Jornal do Avante! está revestida de um carisma excepcional, onde parece que uma espécie de bolha revivalista está isolada do resto da realidade. Trata-se de assistir a uma zona livre de fast food e quase todas as formas capitalismo imperialista, e onde velhos e novos se atropelam de forma civilizada perante uma poderosa e bem oleada máquina de militantes voluntários que fazem a festa existir. O proverbial e lendário poder organizativo do PCP, provavelmente o mais poderoso exemplar em vias de extinção na Europa do comunismo marxista-leninista, deixou-me espantado. Como num belo exemplo idílico de socialismo, o proletariado organizava-se de forma a executar problemas complexos de organização com a máxima eficiência.

Mas mais que as questões de desempenho e de coloração militante existia a festa em si: um ambiente de genuína fraternidade como nunca presenciei, e que me senti privilegiado em sentir na pele tal alegria de grupo.

Calor e falta de banhos à parte, assim como um arrufo empolado, a festa do Avante mostrou-me uma miríade de sentimentos diferentes e de que eu não estava a espera, como naquelas experiências que se devem recomendar a gregos e troianos. Foi sexta a domingo em grande, acelerador a fundo, saltando ao som da Carvalhesa, tentando adormecer na tenda debaixo de gritos da Elsa, provando os Mojitos, descansando à sombra, passeando ao Sol e deliciando-me com o Sérgio. Para o ano há mais camaradas! E espero que seja com os mesmos camaradas.

O tempo tem escasseado para martelar no teclado, mas tal não significa que a ausência de palavras seja sinal de ausência de momentos que perdurarão na memória. O aniversário da princesa teve um significado importante para mim, não só pela festa magnífica que foi, tão repleta de convívio e amizades de todos os quadrantes, mas também por me colocar na minha praia perante tantas mudanças boas na minha vida.

Há situações que nos marcam, e por vezes os momentos mais singelos fazem-nos perceber o quanto o destino pode dar cambalhotas e tornar um mundo cinzento num explosão de cores Robbialac. Naquela tarde pude constatar no meio de uma casa cheia que definitivamente o meu mundo teve uma mutação carregada de felicidade e amor.

Para que a noite acabasse, especial como a tarde que a antecedera, só ouvir o «Just like Heaven» dos Cure no recanto revivalista chamado Bateaux, encantado pela beleza principesca. E depois no final aquele toque tão especial de aventura, tão divertida e ao mesmo tempo simbólica num local tão estranho. Especial.

Um Verão não é Verão se não se desgastar o corpo e alma, bamboleando o calor do estio e celebrando a época d e descontracção. Esta estação está a ser uma das mais agitadas das inumeras que já vivi, com uma agenda verdadeiramente carregada. Praticamente não me recordo de usar o meu solário particular ou de dar mergulhos nas águas glaciares da minha praia, correndo de eventos em eventos de primeira linha. Mas uma coisa eu sei… é o melhor Verão que eu já tive. E ele ainda não acabou!

Algo de verdadeiramente impressionante na vida é que esta se rege também de acordo com a lei do caos. Mesmo que se consiga idealizar um futuro, determinar as variáveis com mais impacto nesse espaço temporal, um pequeno batimento de asas de uma simples borboleta pode causar um furacão não esperado noutro espaço da nossa vida.

Mesmo quando os parâmetros estão cinzentos, e se faz uma previsão para uma chuva torrencial, pode aparecer a mais doce bonança. Tudo porque pequenas nuances escapam as equações dos modelos de previsão e que podem trazer fortes impactos. Mas é neste espaço de quase incerteza que a tômbola da vida gira e nos vai premiando com grandes jackpots. E isso é o piri-piri da vida.

Toda a minha pequena jornada tem sido disso exemplo: não se fazem planos que não possam ser abandonados logo que o caos no dê uma patada daquelas que doem. É necessário saber que na esquina está a mais profunda incerteza, mas que pode ser o el gordo, como não. Só é necessário comprar a rifa e não perder a esperança.

Eu tenho a noção que algures uma borboleta bateu asas e algo muito surpreendente se deixou abater de repente no meu presente. Viva o caos!


Às vezes apercebemo-nos que amadurecemos e que estamos mudados. A matriz da alma modificou-se sem avisar, alterou-se, melhorou-se sem que tivéssemos consciência da requalificação interna.

O Verão sempre foi um florir de intensas emoções ou um sublimar de esperanças. De mão dada com um Sol cada vez mais intenso, é normal nas minhas recordações, atingir uma espécie de pedrada de estio. Sentir-me livre e vivo. Alegre.

Este ano foge à regra. Todos os hábitos caem por terra, todas as recordações não fazem sentido. Não é o estio que me faz pulsar. Nem são as esperanças que me alegram, ou o sol que me aquece o espírito. É algo mais substancial, menos efémero. É algo de permanente que não desaparece numa ressaca outonal, ou se esfuma numa memória devidamente arquivada no cérebro na zona denominada Verões do passado.

A vivência é outra, a maturidade e equilíbrio são o sustentáculo de um novo paradigma, daquilo que eu sempre desejei e agora está comigo. Um pico de felicidade. Um verdadeiro e absoluto Cloud 9 .

A reabertura dos tempos de lazer foi no mínimo interessante. O facto de me ter dedicado pela segunda vez na minha vida ao desporto radical do campismo, e na companhia do veteraníssimo mestre, tornaram uns dias que seriam à priori de dolce fare niente de pasmaceira numa inestimável experiência e tempo de lazer pacato.

Tomar rumo ao sul sem chegar a latitudes pavorosas, montar o barraco e comprar a múmia que me havia esquecido de trazer fizeram-me bem, e apesar do tempo estar pavoroso para radicais, foi um quality time de cavaqueira, VTES, companheirismo, formigas e dormir no chão.

Em última análise foi importante mudar de ares, estar longe de um volante visitar locais quase de forma aleatória sem preocupações de tempo ou espaço, apenas me deixando relaxar com a amizade e a Nikon para saborear a passagem das horas. Nos longos diálogos as conversas intransigentes e inteligentes deambularam desde o sentido da vida, ao cortar nas casacas e a inocência perdida que reina no campo de batalha dos trintões, e como não podia deixar de ser – na história universal. Uma salada de fruta intelectual que me levou a ter sestas ou quase-sestas. Assim a espera foi brilhante e não custou tanto no início. É bom ter alguém com quem contar.

Como vestindo a mais inexpugnável das couraças, sinto-me protegido de todas as adversidades. Nunca me senti tão protegido do desalento ou da inépcia, do quebrar do espírito. A energia brota do âmago com intensidade e disponibilidade imensa.

Tudo porque o coração pulsa cheio de lufadas de sangue de esperança, repleto de carinho e ternura. No calor deste estio antecipado, dou-te a mão, num novo caminho, que se palmilha rápido e certo. Como se há muito estivesse mapeado na consciência um trilho triunfal, rumo a uma certeza.

Quente e vibrante, perco-me num mar em que a ausência se torna impensável, e em que o suspiro é uma constante. São dias perfeitos.

No interregno das emoções fortes, foi-me necessária uma pequena barbárie masculina do campo futebolístico. O verdadeiramente glorioso tentava a dobradinha, e colocou-se em cima da mesa a possibilidade de ir numa comandita de adeptos ferrenhos até ao estádio do Jamor.

Ver o desporto das massas nunca me fez pulsar de emoção por aí além, mas devo reconhecer que assistir a uma partida de futebol do nosso clube de eleição dá muito adrenalina e eu gosto de todo o teatro envolvente, todo o cerimonial clubístico e da clubite de massas dentro dos domínios da civilidade. Ela ainda existe mas não vem como é obvio nas notícias que só se interessam por revaches asininas e histerismos de violência nos estádios ou de animais, que por sinal vi ao vivo pela primeira vez.

E eis que o comando de torcedores se organiza, muito embora duas desistências de última hora tenham comprometido bastante a organização e em particular o orçamento. Um comando formado por sete indomaveis, munidos de uma carrinha de transporte se faz à estrada na madrugada de domingo. Eu era dos poucos que não fazia parte das forças policiais, onde inspectores e sargentos à paisana se faziam à grande cidade.

O inspector P tomou o volante, e para bem dizer, com bastante sucesso até uma malfada subida da CREL, onde as últimas gotas de gasóleo se evaporaram e nos deixaram a penantes. Só faltou o garrafão de 5 L de praxe para nos disfarçarmos do verdadeiro rancho do piquenique portuga enquanto esperávamos contrafeitos pelo providencial auxílio da Brisa com o seu bidãozinho de 28 €.

Desfeito o contratempo, rumamos a um almoço pantagruélico, à antiga portuguesa no Forcado de Loures, com a tradição cretina em que os aniversariantes beijam uma cabeça de touro empalhada ao som da zarzuela tauromáquica, mas em que as entradas são de ir até às lágrimas. Regados e de estômago cheio, seguimos para o Jamor, esse belo parque de romarias e piqueniques à séria. No caos de pó para estacionar e das correrias de última hora lá nos instalamos em plena claque setubalense do lado oposto ao mar Azul do nosso FCP.
Felizmente o ambiente de taça estava nos nossos vizinhos, que após o jogo nos cumprimentaram com excelente fair-play. E a dobradinha foi nossa muito embora o local fosse tão mau que nem deu para apreciar o jogo… mas a festa sim.

E a quinta dobradinha do FCP foi a minha primeira e muito provavelmente ultima ida ao Jamor, pois não posso imaginar-me outra vez a levar com duas horas para sair do mar de pó onde a carrinha estava engarrafada. Valeu a companhia e a escolta policial e o facto de o Cavaco ter entregue o caneco. C´um caneco!

As palavras não são capazes de suster o peso das emoções fortes, nem milhares de frases podem descrever com autenticidade as imagens que ecoam na minha mente.

Como na música do Chico Fininho, só por leviandade se pode sorrir assim, – mas não o posso deixar de o fazer.

As últimas semanas têm sido invulgarmente felizes e plenas de luz. Se eu já estava resignado a ser um adepto fervoroso dos voltes de face do destino, numa roda da fortuna que não para de rolar a seu bel-prazer, então agora sou um fanático do caos. Sei que neste momento de giro, os meus planos mal se podem cingir a mais de um par de horas… ali mesmo ao virar da esquina pode estar a maior e a mais bela inesperada surpresa, como um desalento não previsto.

Sem planos navegar à vista, sem mapas de navegar com rota traçada, olho as nuvens de soslaio, cheiro o vento e deixo que a bússola fique menos nervosa. Logo, logo o vento vira e vai conduzir-me para um destino idílico, muito mais precioso do que eu poderia alguma vez supor. Ser bom marinheiro é também saber para onde o mar da vida nos quer levar e deixar que a bolina não nos pare. Não é bom contrariar os elementos quando eles nos sorriem, e estou a adorar viajar até onde mil planos não me levariam, mas só o mais feliz acaso me transportaria.

Mil conversas podem-se perder, mil frases podem ficar esquecidas durante anos num recôndito neurónio. Mas a música perdura, lembrando-nos de uma miríade de momentos, sentimentos, alegrias e até euforias.

Sempre gostei de música. Avidamente consumo música, tenho gostos eclécticos sem nunca comprometer a qualidade. Desde Jobim a Franz Ferdinand, de LSD Sound System a The Clash, tudo sem o seu espaço, nos meus inúmeros catálogos virtuais de músicas preferidas. Passado, presente e futuro que trazem melodias e memórias, conforto e alivio, esperanças de novas emoções fortes.

E verdade seja dita: nada como um iPod como companheiro de corrida. É garantia de novo record pessoal.

O meu feitio tem muitas facetas contraditórias, muitos defeitos, mas ultimamente vive carregado de esperanças e equilíbrios ganhos a custo. Uns dos meus escapes favoritos são as minhas pequenas excentricidades, que podem ir de um universo relativamente banal da sanidade, até ao limite de ser tido como uma das possíveis aquisições da equipa de futebol 7 do Magalhães Lemos.

O facto de não me impor muitas regras, permite-me abraçar esses pequenos devaneios com muitas repercussões do foro monetário e até físico. Se aceitarmos um conceito bastante válido de que não poderemos levar o cartão multibanco no caixão, e que a certa altura a nossa saúde vai mesmo desaparecer apesar de todos os esforços em contrário, coloca-se-nos uma questão muito simples: porque não?

É certo que me recrimino por alguns gastos excessivos, mas estar no clube gourmet é sempre uma razão de júbilo, em que cada cêntimo é maximizado até ao último momento de prazer. Por outro lado, os gadgets que povoam a minha casa têm tido enorme utilização, tipo hour-and-hours of fun. Claro que fico com um pouco de sentimento de quase culpa, ou até vergonha por me estar a tornar um geek fora de tempo. Mas eu sou dado a excentricidades, certo? Se me apetecer ter comportamentos típicos Cro-Magnon, e desde que não verifique se a moca funciona correctamente quando admnistrada no craneo dos vizinhos, ninguém tem nada a ver com isso.

Também não vou ser possuido no amago por um ancestral homem de Neandertal, apenas porque prefiro socializar-me de uma forma mais exclusiva e talvez mais intensa, prosseguir com uma maior auto-indulgência, maior receptividade aos meus apetites, e fundamentalmente quebras hábitos e correntes. Liberar-me dos condicionamentos na sua forma mas acabada e última.

Em determinados períodos, vá-se lá saber porque carga de água, sou demasiado propenso a letargias cíclicas. O facto que não escrever estas últimas semanas aqui apesar de uma enorme vontade é disso um exemplo acabado de como sou um ser bastante inconsistente para com os meus pequenos prazeres.

Desculpas aparte, estes últimos dias têm sido propensas a fait divers que me recordam de algo verdadeiramente excepcional: a vida tem inúmeras surpresas e quando julgamos que o planeta terra já rolou tudo que tinha que rolar para nós, eis que algo faz com que mergulhemos na máquina de lavar a roupa em pleno ciclo de centrifugação.

Acho que são as pequenas-grandes diferencias que nos recordam que a Vida tem sempre um V maiúsculo e que o deus das pequenas coisas está presente para nos dar momentos únicos de beleza e êxtase. Basta que tenhamos a alma aberta para abraçar novas aventuras.

Correu tudo bem. A visita da olímpica amiga fez com que o fim-de-semana fosse especial e apesar do corre-corre. As desilusões dos antros noctívagos programados com antecedência e escolhidos a olho para dar um ar de bom cicerone mostraram-se bastante ridículas.
Felizmente a gastronomia quase estritamente vegetariana foi brilhante e o risco audaz da galinha Vindaloo deram um sabor especial a umas conversas muito interessantes e lúcidas.

Nada melhor que ter uma visita tão ilustre e nobre para alegrar os nossos dias com a sua simpatia, inteligência e cultura e estreitar laços de amizade além fronteiras.

Pelo meio deu para agraciara pequena L. e os seus babosos pais, no seu primeiro aniversário.
O tempo passa ligeiro…

Nada como um péssimo despertar, uma boa pitada de insónias recorrentes e um desejo profundo de deixar os pensamentos fluírem desordenados para limpar a mente. Suponho que os ciclos de vida quotidiana seguem a malfadada piada dos interruptores: umas vezes para cima, outras vezes para baixo. Para contrariar isso, desliga-se o telemóvel, presenteamo-nos com uma boa sessão de exercício masoquista, seguido de um bom banho de imersão, acende-se um incenso e metemos alguma música particularmente intimista no iPod. Melhor que uma dose cavalar de Valium!

Estava cansado e irritadiço, como uma criança que não dorme. Necessitava de um refúgio das insónias e do stress.
Não cruzei os braços e agi. Com alguma urgência que não entendia bem, com uma impulsividade nada comum.

E eis-me em direcção à serra dos meus antepassados, junto para as minhas raízes da raia em pleno dia de gelo. A viagem foi indecente, como a estrada. Mas eis que à chegada, acolhido pela noite e um vento glaciar regresso aquela casa de granito. De súbito a urgência da minha deslocação como que se desvendou, fez sentido. O meu tio completava setenta anos de vida e eu não o sabia. Inconscientemente a minha pressa tinha uma razão e isso era já um prenúncio de uma peregrinação bem-sucedida.

A casa estava quente apesar de o frio aparecer no exterior com um gume afiado e dilacerante. O amanhecer após uma noite de sono longo e sustentado como não tinha à muito tempo pareceu-me convidativo a mais uma incursão e comunhão entre o Eu e a imensidão do horizonte raiano.

Ao sair equipado para as caminhadas e intempéries fui atropelado por um caminhão TIR vindo directamente do árctico a ponto de ter que me reforçar com várias camadas de vestuário. E lá fui rumo a liberdade sem rumo numa caminhada nos planaltos agrestes. Vale após vale fui-me perdendo, absorto no silêncio perfeito de escutar o vento gelado, com a alma esvaziando a mente a cada passo, perdendo a noção de tempo. Logo o chão incrustado de geada, alternava com o gelo a que o regato transbordante se tinha transformado. O gado tentava ruminar o pouco feno pois os lameiros exibiam turfas de ervas congelada e aqui e ali uma ave de rapina esvoaçava, desesperada por um roedor para matar a fome.
Por pouco uma matilha de cães pastores de raça indeterminada, mas possantes não me tomava por um pilha-ovelhas ou lobo em pele de cordeiro.

Foi então que o vislumbrei lá longe. Cinzento e massivo, um enorme penedo reinava ao seu redor. Arredondado de um granito milenar da Serra chamava por mim, e sem perceber tomei o seu rumo saltando muros de pedregulhos instáveis e passado debaixo de arame-farpado.
Ao chegar a sua beira percebi que teria de o conquistar apesar das suas linhas circulares e esguias com mais de 5 metros de altura. Era como um conjunto de ovos graníticos alinhados. Após voltas e mais voltas, descobri-lhe os pontos fracos, um acesso quase inacessível para o topo das suas parábolas. A custo venci-o. E lá no alto pude ver quilómetros infindáveis, só, em comunhão comigo mesmo e com a natureza. Para além do rendilhado verde-escuro, traçado de linhas cinzas, cresciam as montanhas espanholas com neve nos cumes. Atrás o Sol brilhava acima dos últimos cumes da Estrela. Senti-me rejubilar e gritar de alegria por aquela conquista. E não fosse o corpo dar sinais que em breve estaria em precisar urgentemente de líquidos quentes por ali ficaria.

De volta as lides familiares, aproveitei para dar um passeio pela tarde até às terras da família munido com o meu olho mecânico, mas o frio crescia e as nuvens prometiam o tom escuro. Ao regressar o vento cortava as orelhas e a face parecia um mísero pimento dorido.

Ao anoitecer nevou. Primeiro a medo, pequenos flocos minúsculos. Já escuro, os flocos eram espessos e um manto branco pousou aliviando o frio e paralisando o vento. Branco níveo, buscava reflexos florescentes de azul. Berrava por dentro de emoção.
Na manhã domingueira na antecipação coloquei-me em novo percurso, desta vez calcando uma camada de neve já compactada, sentido o luz branca e intensa, perdido e zonzo com o espectáculo único. Frio por fora e quente por dentro, vi a neve escoando-se lentamente à medida que o Sol subia, calmo e sereno.

Compreendi que me falta espaço na cidade, onde os horizontes são cortados e curtos. Na aldeia não sofro da claustrofobia do horizonte. Nada esconde o limite do nosso olhar. E nada como o silêncio que nos acolhe e envolve na natureza para relaxar a alma.

Foi sem dúvida um Sábado diferente. Ainda a ressabiar de uma noite agitadíssima, eis-me madrugador, com muitas horas de sono é dívida e neurónios ainda motivados a Gurosan, a tentar pedalar.

O que seria um fim-de-semana desportivo, tornou-se uma festa de encontro de novos amigos num local solarengo e místico, onde as ondas chocavam intensamente contra as rochas formando fogos de artificio de espuma. R. é um polo dinamizador, um carisma e encanto a que só se pode devolver genuína amizade. Assim como aos amigos que foram chegando ao longo da tarde dos mais variadas e longínquas origens. Subitamente tudo se tornou uma tarde de copofonia de loiras de esplanada… estilo Chopp.

A noite foi o reverso da medalha, em que os neurónios deram tilt apesar de estar com o irmanzito das ilhas a ver o nosso glorioso a portar-se miseravelmente. Depois de anoitecer tudo se tornou absurdamente mau!

Acho que a teoria do Búfalo, em que os neurónios mais fracos são abatidos primeiro, – neste caso através de uma analogia precária relativa à bebida – é mesmo uma piada de mau gosto. Nesta semana sinto que só os meus búfalos-neurónios mancos continuam a correr nas pradarias de uma mente incendiada. O resto da manada ou já tem as peles a secar ou pôs-se a monte