amigos

A nova geração apresenta-se. Um após outro, os rebentos surgem, dando azo a uma nova fase da vida.

Os meus amigos de infância, da escola, da praia, do liceu, da faculdade, do trabalho, cumprem o desafio inexorável do perpetuar da espécie, um imperativo genético gravado desde os tempos primário no nosso âmago. E como é belo criar um filho, mesmo sabendo da dificuldades contemporâneas da paternidade.

A questão que muitas vezes assola a minha mente é o legado que pretendo ( e quando digo eu também me refiro a todos na minha posição de pai ) – passar a nova geração. Dos setenta para os dois mil, neste país à beira mar plantado muito mudou, alias é perfeitamente irreconhecível o pacato país em que vivo. Não só porque eu nasci em ditadura e as primeiras memorias de televisivas que tenho se prendem com o incrível PREC – ou seja existe hoje uma democracia trintona e algo murcha que tanto contrasta com a minha infância. A paisagem das cidades asfaltou-se e pelo menos na minha cidade o centro municipal passou de um jardim com pombas e autocarros laranjas de dois andares, que deu lugar a um campo de granito que só tem gaivotas.

Lembro-me dos banco estarem em banca rota – um conceito estranho para um pirralho que apenas assumia que era algo mau, pois meus pais estavam preocupados. Curiosamente existe um paralelismo interessante com a crise financeira de hoje, pelo menos nalguns receios, com a grande ressalva que hoje estamos a lidar com uma crise global e não somente nacional.

Por isso me questiono muitas vezes: que futuro daremos à próxima geração?

Quem pagará o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores?
Quem, dentre amigos, tão amigo
Para estar no caixão comigo?
Quem, em meio ao funeral
Dirá de mim: — Nunca fez mal…
Quem, bêbado, chorará em voz alta
De não me ter trazido nada?
Quem virá despetalar pétalas
No meu túmulo de poeta?
Quem jogará timidamente
Na terra um grão de semente?
Quem elevará o olhar covarde
Até a estrela da tarde?
Quem me dirá palavras mágicas
Capazes de empalidecer o mármore?
Quem, oculta em véus escuros
Se crucificará nos muros?
Quem, macerada de desgosto
Sorrirá: — Rei morto, rei posto…
Quantas, debruçadas sobre o báratro
Sentirão as dores do parto?
Qual a que, branca de receio
Tocará o botão do seio?
Quem, louca, se jogará de bruços
A soluçar tantos soluços
Que há de despertar receios?
Quantos, os maxilares contraídos
O sangue a pulsar nas cicatrizes
Dirão: — Foi um doido amigo…
Quem, criança, olhando a terra
Ao ver movimentar-se um verme
Observará um ar de critério?
Quem, em circunstância oficial
Há de propor meu pedestal?
Quais os que, vindos da montanha
Terão circunspecção tamanha
Que eu hei de rir branco de cal?
Qual a que, o rosto sulcado de vento
Lançara um punhado de sal
Na minha cova de cimento?
Quem cantará canções de amigo
No dia do meu funeral?
Qual a que não estará presente
Por motivo circunstancial?
Quem cravará no seio duro
Uma lâmina enferrujada?
Quem, em seu verbo inconsútil
Há de orar: — Deus o tenha em sua guarda.
Qual o amigo que a sós consigo
Pensará: — Não há de ser nada…
Quem será a estranha figura
A um tronco de árvore encostada
Com um olhar frio e um ar de dúvida?
Quem se abraçará comigo
Que terá de ser arrancada?
Quem vai pagar o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores?

Meia década é uma medida de tempo demasiado longa para o meu gosto. De todos os projectos que me propus levar a cabo ao longo da vida não duraram tanto. Muitas vezes a volatilidade do meu planeamento não me permite levar a cabo durante tanto tempo os planos de longo curso. Também não é normal antever à distância de 5 anos, que resultados teremos da obra que acabamos de começar, e se vá evoluindo ao longo do percurso. O que ao início podia ser um relato irreverente de vivências para um grupo restrito de amigos passou aos poucos a ser um fiel depositário de momentos intimistas, ou até uma forma de expressão que age como uma válvula de descompressão.

Quem sabe se o gosto ou alguma maior constância da alma, hoje o meu diário atinge um aniversário sugestivo, e que se revela um companheiro e amigo que me tem secundado numa parte já significativa da minha vida. É com algum prazer e às vezes até muita perplexidade que revejo alguns posts passados, revejo algumas fases importantes da minha vida. Desde as dificuldades e abismos emocionais, às façanhas e alegrias que perduram, há de tudo um pouco.

Nesta cápsula dinâmica do tempo cabem muitos pensamentos, imagens e poemas que me têm atormentado ou motivado, acabando por me felicitar por ter um confidente tão estranho para um homem de meia-idade. Talvez a juventude da alma, a insensatez do momento ou a necessidade de tratar mal a língua de Camões motivem uma relação tão longa e frutuosa. Um bichinho que me faz companhia nos bons e maus momentos…

Foi sem dúvida um Sábado diferente. Ainda a ressabiar de uma noite agitadíssima, eis-me madrugador, com muitas horas de sono é dívida e neurónios ainda motivados a Gurosan, a tentar pedalar.

O que seria um fim-de-semana desportivo, tornou-se uma festa de encontro de novos amigos num local solarengo e místico, onde as ondas chocavam intensamente contra as rochas formando fogos de artificio de espuma. R. é um polo dinamizador, um carisma e encanto a que só se pode devolver genuína amizade. Assim como aos amigos que foram chegando ao longo da tarde dos mais variadas e longínquas origens. Subitamente tudo se tornou uma tarde de copofonia de loiras de esplanada… estilo Chopp.

A noite foi o reverso da medalha, em que os neurónios deram tilt apesar de estar com o irmanzito das ilhas a ver o nosso glorioso a portar-se miseravelmente. Depois de anoitecer tudo se tornou absurdamente mau!

Acho que a teoria do Búfalo, em que os neurónios mais fracos são abatidos primeiro, – neste caso através de uma analogia precária relativa à bebida – é mesmo uma piada de mau gosto. Nesta semana sinto que só os meus búfalos-neurónios mancos continuam a correr nas pradarias de uma mente incendiada. O resto da manada ou já tem as peles a secar ou pôs-se a monte

A principio é simples, anda-se sozinho
passa-se nas ruas bem devagarinho
está-se bem no silêncio e no burburinho
bebe-se as certezas num copo de vinho
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

Pouco a pouco o passo faz-se vagabundo
dá-se a volta ao medo, dá-se a volta ao mundo
diz-se do passado, que está moribundo
bebe-se o alento num copo sem fundo
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

E é então que amigos nos oferecem leito
entra-se cansado e sai-se refeito
luta-se por tudo o que se leva a peito
bebe-se, come-se e alguém nos diz: bom proveito
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

Depois vêm cansaços e o corpo fraqueja
olha-se para dentro e já pouco sobeja
pede-se o descanso, por curto que seja
apagam-se dúvidas num mar de cerveja
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

Enfim duma escolha faz-se um desafio
enfrenta-se a vida de fio a pavio
navega-se sem mar, sem vela ou navio
bebe-se a coragem até dum copo vazio
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

E entretanto o tempo fez cinza da brasa
e outra maré cheia virá da maré vazia
nasce um novo dia e no braço outra asa
brinda-se aos amores com o vinho da casa
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida.

Letra de Sérgio Godinho

Três anos é um longo tempo para manter um diário online. É uma questão de paciência, perseverança ou será uma questão de teimosia ou mera estupidez?
Quando escrevo sinto que os contornos e as motivações mudaram, assim como o meu corpo e espirito mudaram. Envelheceram e amadureceram. Melhoraram de certa forma, num upgrade que a vida oferece â medida que os anos correm no calendário.
Hoje muitos dos dados adquiridos do período em que estava na grande cidade se tornaram obsoletos e nada me impele a escrever para um grupo de amigos, como dantes o fazia, numa espécie de jornal de parede comunitário onde colocava os meus papeis.

Hoje essa faceta de grafitti de pensamentos, extinguiu-se com um novo despertar, para voos mais elevados, para vivências mais reais. Mas o mais importante foi também, ter tido graças a este espaço, a hipotese de me reencontrar e ver que existia toda uma nova dimensão não programada que em última analise, tranforma a pouco e pouco num novo ser, com uma nova vivência com V graúdo. Foi como se o diário de um meliante me libertasse e me mostrasse um destino que não antecipei e a pouco e pouco me desse aquilo que não tinha sequer atrevido almejar.

Hoje sei que só mantenho este espaço porque é uma espécie de casulo abandonado mas apreciado, que me deixa, decerto recordações de um passado fastidioso, mas também das mudanças que me atraíram para uma subida de divisão, com direito a taça e tudo do desporto que é a Vida.

Talvez o abandone em breve, talvez o reanime de uma comatose intermitente, talvez simplesmente o esqueça parado no tempo, como uma caixa de espelhos feita capsula do tempo.

Mesmo assim parabéns!

Tinha decidido já há algum tempo ir a um festival de Verão e o de Paredes de Coura pareceu-me o mais apelativo. O problema que se colocava era o facto do dia mais interessante era a terça-feira à noite, algo terrivelmente incompatível para quem tem o seu ganha-pão de picar ponto.

Fiquei indeciso um par de semanas, mas finalmente decidi-me a ir. A medo tirei à última da hora um dia de férias graças a um bom relacionamento com o patrão. Eu e N. já havíamos sonhado um par de vezes com esse devaneio, proporcionou-se a ida com S. e um agradável Lisboeta que infelizmente não podia estar sujeito a muitos decibéis por motivos crónicos. Feitos à estrada voamos rumo ao norte, comigo o volante. Após um jantar simpático, eis nos a cair no recinto que eu não conhecia.

Chegamos tarde e P.J. Harvey fez com que apaixonasse ainda mais pela sua música. Inenterruptamente as suas músicas desprendiam-se superiores na actuação ao vivo impressionantemente supeiores a qualquer gravação com pós-produções. A verdadeira diva! Depois Placebo foi também bastante bom, embora só brilhassem verdadeiramente no final, em especial com o tema derradeiro e apoteótico “Were´s my Mind” muito fiel ao original dos Pixies.

O dia de descanso que se seguiu foi demasiadamente breve e fugidio, estendido na praia, e assediado pela presença da afável amiga colorida de outros tempos. Já não há cores, e é sempre bom rever amigos, mesmo que assediado em correntes simultâneas. Estive também com B. e Inspector P. Gostava de saber a que entidade divina devo agradecer por ter amizades duradouras que apesar de longos interregnos forçados se revitalizam tão fortes.

versão brasileira original

Cinderela era uma moça muito bonita, boa, inteligente e triste. Os pais tinham morrido e ela morava num castelo. A dona do castelo era uma mulher muito má que tinha duas filhas: Anastácia e Genoveva. Borralheira, sozinha, fazia todos os serviços do enorme, castelo (limpava, cozinhava, passava a roupa, arrumava) e nada recebia em troca. Seus únicos amigos eram os ratinhos, os pássaros, um cavalo e um gato.
Certo dia, o mensageiro do Rei passou pela cidade e informou que ele convidava todas as moças para um baile, onde o Príncipe ia escolher a esposa.Genoveva e Anastácia brigaram, porque ambas queriam ser a esposa do Príncipe.
– Eu também posso ir? – perguntou Cinderela.
– Se tiver um vestido bonito e depois de acabar todo o serviço! – respondeu a dona do castelo.

Cinderela correu para o quarto, chorando, porque não tinha vestidos bonitos. Os ratinhos e os passarinhos, que ouviram a conversa, fizeram um vestido para a amiga.
No dia do baile, quando a moça entrou no quarto, depois de trabalhar o dia inteiro, ficou surpresa: Ah, que vestido lindo, feito pelos meus amiguinhos! Borralheira ficou feliz, porque, agora, também poderia ir a festa. Mas, quando chegou na sala, toda bonita, as duas irmãs invejosas pularam em cima dela e rasgaram o vestido.
Chorando muito, Borralheira recolheu os trapos, pôs tudo dentro de um saco e correu para o jardim.

De repente, apareceu uma luz muito brilhante que se transformou numa linda mulher.
– Eu sou sua fada-madrinha e vim ajudar você. Vou lhe fazer um vestido lindo e você poderá ir ao baile. Mas esteja de volta antes da meia-noite, quando tudo voltará o que era.
A fada tocou a varinha de condão em Borralheira, e ela surgiu num vestido multo bonito. Uma abóbora virou ,- carruagem; os ratinhos fogosos cavalos brancos; seus tamancos de madeira, ricos sapatinhos de cristal.
– Obrigada, minha boa fada-madrinha – disse Borralheira. – Até logo!

– Até logo! – respondeu a fada. Divirta-se, mas não se esqueça: o encanto acabar¡a à meia-noite!
Cinderela foi a moça mais bonita do baile. 0 Príncipe se apaixonou logo que a viu e dançou com ela a noite inteira.
Anastácia , Genoveva e a mãe ficaram furiosas.

Quando já ia bater a meia- noite, Borralheira saiu correndo, com medo de que o encanto se desfizesse na frente de todos.
O Príncipe correu atrás dela, mas não alcançou-a. Durante a fuga, Borralheira perdeu um dos sapatinhos de cristal na escadaria do palácio.
Como a bela moça não tinha tempo para voltar, deixou o sapatinho ela mesmo. Cinderela ainda estava na rua quando tudo voltou a ser como antes. Só o sapatinho de cristal não voltou a ser o velho tamanco de madeira.
Ah pensava ela, enquanto voltava para casa como o Príncipe é bom e bonito! Pena que eu nunca mais o verei de novo! Gostaria tanto que ele me escolhesse para sua noiva…

Enquanto isso, no castelo, o Príncipe achava o outro sapatinho de cristal. Como aquela moça era bonita e graciosa! – disse ele ao Rei. Mas eu nem sei o nome dela. A única pista que tenho é este sapatinho…
0 Rei, percebendo que o filho estava apaixonado, mandou que um criado experimentasse o sapatinho de cristal em todas as moças do reino. Era impossível que houvesse mais de uma moça com aquele pezinho tão delicado.
0 mensageiro levou muito tempo para descobrir a verdadeira dona do sapatinho, mas, finalmente, achou Cinderela.
– Que beleza! – exclamou ao ver que o calçado dava direitinho no pé da moça. – Encontrei quem o Príncipe queria!
Imaginem a inveja das donas do castelo quando Borralheira se casou com o Príncipe.

Reserva-me o direito de um fim-de-semana que me permitisse algum descanso e pacatez. Talvez conseguisse meditar e por em prática alguns ensinamentos. Mas nada disso sucedeu. Logo na sexta-feira descobri que ambicionava antes, e de forma ávida, toda e qualquer folia a que pudesse deitar as mãos, mesmo que, com resultados quase catastróficos.

Um jantar com Inspector P. e N. revelou-se um repasto revivalista e simultaneamente enternecedor, devidamente regado a um tinto único que me colocou em dois tempos na lista de quem tem lugar reservado no purgatório. Cheguei a casa já a chuva encobria um sol demasiado alto para que não me sentisse envergonhado, repetindo mentalmente que o meu juízo é algo exageradamente volátil.

Na pacatez da ressaca, vislumbramos que a euforia da noite anterior, serve de um merecido tubo de escape, mas que não perdoa em termos de desgaste de motor. O uso intensivo de aditivos na combustão pode causar danos à máquina que nem um mecânico credenciado possa reparar. Felizmente o Mestre fez-me uma visita para compensar a nostalgia de uma praia chuvosa, e trouxe-me a sua companhia sempre bem-vinda. Perdemos ainda alguns neurónios no nosso envolvente vício e pusemos o crochet em dia. A insistência da pluviosidade intermitente e o meu sono impediram qualquer sortida mais atrevida, ficando-me pelos ares costeiros meios desertos, numa pacata companhia de outros tempos.

Dormi até não poder mais e Domingo, nenhum dos meus planos se poderia concretizar, recheado de companhia, visitas, amizades, em ternos momentos de velocidade bem lenta, reflexivos e relaxantes, já sob um Sol generoso . O isolamento que me propunha não existiu, e muito provavelmente não voltarei a ter um espaço languido antes que o Verão vá a sepultar.

Estranho é assistir embevecido ao pequeno baby boom do meu circulo de amigos. Acho que os meus olhos brilharam varias vezes perante as lindas filhotas do Inspector P. e do Bi. Enternecem-me as crianças pequenas, creio que estou a desenvolver inconscientemente um instinto paternal exacerbado. Creio que o meu relógio biológico está-me a dizer que são horas de assentar, talvez tirar a sela do cavalo e vender o Colt, mais o cinturão de pistoleiro e as esporas da praxe das texanas. Talvez seja hora de cortejar aquela jovem moça de familia em vez das visitas às rameiras enrugadas do Salon, e criar uma família. Talvez seja mesmo chegado o tempo de arranjar a tal bonita casa na pradaria…
Ou talvez não. Talvez eu tenha que ser um pistoleiro veterano, deambulando entre um deserto de cactos e cascavéis até que uma bala com destino traçado me apanhe.

Este calor abrasador é uma benção, mas repercute-se nas oscilações dos meus humores. Lembra-me a América do Sol, dos timmings mais relaxados, de noites aprazíveis e longas. De conversas languidas e olhares indiscretos.

Fez-me bem massacrar M. por uns dias de férias e descanso, abstraído de pequenas coisas que me roem o juízo. Soube bem estar longe, voar na A8 e A1, ter topado a tempo o carro descaracterizado da Brigada de Trânsito (ainda bem que aquelas camisas azuis não enganam ninguém), ouvido as experiências de duas simpáticas estagiárias de Jornalismo, partilhado umas horas pacatas com amigos.

Mas um Verão quente é sempre um Verão quente, e a minha costela Beirã chama-me à natureza e a um ritmo de vida lento no estio. Como tenho um ganha-pão pouco compatível com este tipo de vivência, fico algo taciturno. De certo uns ares de festa Joanina resolverão esta questão.

Ontem acordei algo ressacado, após uma noite algo movimentada no talho da cidade. Verificar uma despedida de solteiro feminina, acabando por ser um encontro bem aprazível, pode ter os seus encantos, mas se se torna um hábito não tem piada nenhuma. Nunca percebi bem esta tradição das despedidas de solteiro: alguém (em geral os amigos ou amigas conforme o sexo de quem se vai enforcar) quer apenas um pretexto para deambolar por casas de má fama, um cometer alguns pecadilhos visuais ou tácteis com stripers ou afins. Felizmente as meninas não estavam assim tão entusiasmadas, e acabou por ser bastante revelador.

Felizmente ontem estive a dormir na minha casinha, enquanto aquele sol da beira-mar me queimava através de um protector solar de factor 30.

Parte I – O dopado

Quando o meu voo terminou e senti aos meus pés a agora diferente sensação de pisar terra firme, algo estava em êxtase na minha mente. Todo aquele cansaço e prostrações do quotidiano tinham-se eclipsado.

Por estranho que pareça não seria a adrenalina pulsante nas veias que me estaria a roubar o periclitante juízo que me resta. Era uma enorme alegria, um fulgor de concretização que nos enche o coração em ocasiões raras. Como se tivesse quase tocado o Divino, elevando o meu estado de consciência, que transbordava.
Ainda perfeitamente nas alturas, a torrente de pensamentos gerados por esta experiência não parava, e sei hoje que a vertigem de repetir na hora a façanha era tão grande que não teria qualquer tipo de auto-controle.

Foi neste estado de graça que desci a colina sinuosa a mais de 100 km/h, fazendo gritar os pneus e disparando continuamente o sistema anti-derrapagem. Estava embrutecido nos movimentos, e felizmente apercebi-me a tempo que já não era um ser alado. Queria partilhar tudo aquilo, mas ausência de palavras e a comoção, e muito provavelmente aquele brilho nos olhos algo alienado, não me tornaram num bom narrador. Já me queimava o telemóvel na orelha, e fui até a casa de C. que oferecia mais um excelente jantar, com N., S., e mais gente do Sá Carneiro . Não consegui comer, nem era capaz de deixar de sorrir. Eléctrico tinha mais visitas por fazer, minhas pernas eram molas, minhas asas ausentes ainda não apresentavam sinais de dormência.

Fui ter com os amigos do Passado, ainda high. Foi um bom resto de serão. Contudo quando chegou a hora de dormir, dei-me conta que ainda estava dopado pela mais poderosa de todas as drogas: a alegria de desfrutar a Vida.

Francamente fiquei desapontado e quase revoltado na minha ida até à grande cidade para o DJ Kitten. Havia como que algo de leproso em relação à concepção inicial, e notava-se a degeneração cancerígena do capital na performance musical. Os cifrões nem sempre permitem que algo festivo e com uma génese tão poderosa possam se repercutir no tempo. Talvez a parte de baixo do Lux, ou o facto da ausência do verdadeiro Club Kitten portuense possam ter contribuído para o desaire das minhas espectativas, mas tudo que posso refletir é que não vou querer voltar ouvir falar em festas Kitten. Ponto final.

Por outro lado a companhia foi boa, mesmo assumindo os aspectos negativos do snobismo de S. em relação a mim. Os 600 Km foram bastante bons para o desenlace de uma pequena aventura de fim-de-semana e desfrutar da companhia de amigos, mesmo numa correria de conversas e monólogos quentes.

Mas tudo foi ensombrado por uma daquelas circunstâncias sombrias que nos fazem reflectir sobre a nossa fragilidade existencial. Ali mesmo a chegar ao Lux, depois do longo mas não muito interessante jantar no Chapitô, assistimos em silêncio presos no Táxi a um espectáculo anti-clímax. As luzes da ambulância mostravam ao longe algo de estranho e logo ali quando chegamos assistimos contrariados ao resultado de um hit and run fatal. Um corpo inerte era tapado com uma toalha, uma espécie de certidão de óbito não oficial, tal como é dada no asfalto de qualquer metrópole todos os dias. Só que naquela noite nada de mais sórdido me ocorreria, mesmo em pensamentos mais mórbidos. Mais tarde N. e eu brindamos à Vida. Ela continua …

NO STRESS pós-traumático

3 – Como contabilizar caipirinhas e outros conselhos úteis

Não se devem estabelecer regras quando queremos fugir à rotina. Essa fuga, é para mim extremamente valiosa, pois no intimo do meu ser, sou um perfeito anarquista praticante no degredo capaz de explodir com qualquer ordem imposta.

Desta vez a promessa de explodir com os últimos neurónios ainda capazes de algum pensamento minimamente articulado foi concretizada.
N. e Dr.P. esses fantásticos companheiros de armas encarregaram-se de liderar as hostes revezando-se no comando de operações que eu também capitanei, se bem que de forma não tão frequente.
Devo dizer com franqueza que não poderia desejar melhores companheiros de armas para estas andanças, não só de desfalecimento mental, como também de férias retemperantes.

Foram muitas horas de diversão, muitos jantares que ficam nos anais da história universal gastronómica, muitas caipirinhas, mulatas, etc…

Para calcular o consumo per capita de caipirinhas (ou caipivodkas) tivemos sérias dificuldades.

N. ultrapassou as 100, e a partir daí as contas ficaram mais complicadas. Até esse ponto elaboramos uma base cientifica de calculo:

  • consumo mínimo Jantar – 2 (variável até 5)
  • Resto da noite base média 2
  • Se estiver com uma queimadela solar subtraia 1
  • Dores de garganta, gastroentrite, ou voo no dia seguinte subtraia 3
  • Se houver factor «Oi!» acrescente 3
  • Se na entrada do Club pedirem seu número telefone acrescente 2 (caso consiga dizer meia em vez de 6 subtraia 1)
  • Caso o clube esteja cheio de mais e se alguém conhecido subornou o Barmen acrescente 4
  • Se teve coragem de subornar o Barmen some 2
  • Se está a chover subtraia 2
  • Se esteve a chover todo o dia acrescente 3

Com esta base cientifica atingimos uma média ponderada conjunta per capita de 6.11111 caipirinhas/caipivodkas por noite.

Mas fora estes exageros, que abracei num grito de cisne consciente, nada como um confortável alheiamento e euforia de amizade genuína, sob um cenário de antro do paraíso. Nada de planificações, reservas de hotel, roteiros turisticos.

«-Onde vamos amanhã?», «-Se conseguirmos voo, que tal Salvador?», «-Oi!», «TAM, VASP. VARIG ou GOL?», «-A que pare em menos apeadeiros!» , «-Oi!».

Assim as coisas têm mais graça, mais aventura, adrenalina. Obriga a mente a despertar e estar alerta e a saber horientar-se num território novo e talvez hostil. Mas é isso que nos faz sentir Vivos.

N. praticamente cresceu e se fez homem ao meu lado, conhecendo-o eu há mais de 15 anos, numa amizade que sempre valeu nos bons e maus momentos. Dr.P é compincha de há 8 anos de noites desregradas. Nada como um par de amigos full flavour para tornar as coisas hilariantes e potentes. Nada de lights.
Não vale a pena fazer umas férias assim sem levar um de cada… Antes esquecer a escova de dentes!

A poesia descansa as almas pesarosas e atormentadas. Por vezes basta ouvir alguns poemas solenes e também castiços, para alimentar e saciar a alma, purgando alguma fome ou sede do espirito.
As palavras são medicamentos de acção rápida na nossa alma, dando alivio e conforto, mesmo que falem em fúria e desalento. Ou mesmo alguns lirismo excessivo, mas que mesmo assim produz um sorriso.

N. e eu falamos bastante com Pete, um brilhante astrólogo, feliz por sentir que os seus 20 anos de estudo e o livro que está a escrever, estão a dar o seus fruto. Um após outro, o nosso círculos de amigos ficam extasiados com a precisão das suas leituras: Ju agradeceu-me imenso, N. ainda em choque quer levar toda a gente a Pete. Pete revela-se uma pessoa sensível, e obviamente tinha que ser peixe como eu.

Na noite seguinte N. e eu tivemos um jantar na Foz, por sinal excelente, óptimo para falar nas coisas da vida e retemperar forças, fazer planos de viagens. Depois fomos rir, ouvindo anedotas entre amigos em Mira-Gaia.

É pena que essas noites se repitam apenas uma vez por semana e a horas proibitivas, mas sei que contudo vou repetir a dose. Esta medicação deve ser cumprida até ao fim.

Kitten SB major upgrade Beta

Não me gosto de julgar ou fazer actos de contrição com frequência. Cada vez mais readquiro o gosto pelo carpe diem e sei que planear o nosso futuro com demasiados pormenores apenas nos pode proporcionar amargas e longas frustrações. Viver do passado ou de memórias, acaba por ser um mero inexistir.

O passado não devia condicionar em demasia o nosso presente, mas sendo ele tão forte e entranhado por vezes é complexo o enxotar dos nossos pensamentos e acções presentes. Sem ser condicionante, sem ser motivo de remorsos e outras fraquezas, apenas deve servir de biblioteca de consulta e não de lei. Não é que acredite em fazer tábua rasa do que ficou para trás. Isso nunca se consegue fazer, e até é perigoso. Mas viver de face ao futuro e de costas para o passado é a direcção certa. A única a meu ver que nos faz apreciar a vida.
A cada momento e que nos enche. Por isso prefiro deglutir o presente.

E nada como uma festa do Clube Kitten no Sá da Bandeira para festejar o presente, ignorar o passado, e aguardar o futuro sem ânsias. É o prazer de celebrar momento. Apenas isso.
E que presente foi!!! M. parecia o representante da P.J. do meio e pareceu aderir. N. estava imparável apesar de trabalhar às 11, aguentou-se estoicamente até as 5 e 30 dançando freneticamente. Fazemos uma dupla que envergoria qualquer adolesceste. Até o doutor P. veio aguentar-se e pagar uma rodada de Gins. Apesar de me terem dado um toque nos 130 cavalos umas horas foi suberbo e ganhei a noite. Só faltou I., pois tinha que estudar.

As festas do Club Kitten atingiram a celebridade rapidamente. Nunca imaginei que em Março de 2002, quando pela primeira vez fiquei fascinado pela forma como se desenrolavam as noites do Triplex com um DJ portuense, que já marcara presença em Londres.
Eu já o tinha visto um par de vezes na Matéria Prima e J. contara-me que aquelas festas eram de arromba com música electro-eighties e com mulherio do melhor tudo aos pulos.

Experimentei e adorei.

Voltei a repetir e fiquei fã.

À terceira já não podia passar sem aquela noite mensal, apesar das longas horas de dança, muitos Gins e completa euforia. Já me viciara em Kitten, e já queria fazer umas T-shirt alusivas – com inscrições do género DJ Kitten fan club.

Contudo, tudo que é bom não dura sempre, como costumo dizer. O Kitten no tripl3x tornou-se rapidamente vítima do seu próprio sucesso. Para além da fauna e flora residente e incondicional (estilo belas artes, conservatório, audiofilos e esse meio), começaram a chegar os betos, pessoas-carneiros, pistoleiros e pistoleiras e todo esse género de gente que sai a noite para onde estiver a disco mais cheia. Até as meninas da NTV foram entrevistar este movimento não alinhado da noite da minha cidade.
Como resultado de toda esta procura, Kitten limitou-se a explorar a velha fórmula e a cativar sem provocar, mesmo dando de vez em quando temas fantásticos, como se oferecesse pérolas a porcos.

E a casa cada vez mais cheia. Já enchia às 2 e meia, à 1 e meia já não se podia andar, mesmo de Verão, com os jardins à pinha. O colossal acontecimento era já um happening, e quem é habitue não consegue faltar, apesar de saber que esta insuportavelmente cheio de gente até às sete da matina e que as colunas já estão completamente queimadas, após 45 minutos de débito frenético de kitten.
Depois surgiu a melhor fórmula. Está cheio? Muda-se para um sitio maior! Onde? Os idiotas do talho (leia-se Via Rápida) experimentaram mas não gostaram da música… tipicamente de parolos, como é óbvio daqueles bonecos e bonecas todos com muita areia na cabeça e um belo guarda-roupa. Pérolas a porcos? Sem dúvida.

Nada como achar um local descomprometido. O Sá da Bandeira passa filmes Hard Core e de vez em quando, até dá lá para fazer uns concertos: afinal o teatro está todo arrebentado e parece ter parado algures em 1954. Tem passadeiras vermelhas e tudo. Muito underground-trash style. Era a cara do kitten! Remédio santo.
A potência e o espirito brilhante do ímpeto inicial revivem. Kitten Gold!

Esta minha terceira ida ao Kitten Club prezou-se por uma viagem a esse espirito, com muitas pitadas e revivalismo e gente da minha era a curtir desenfreada até às tantas. Mesmo já com penetras, entusiastas de circunstância e outras coisas indefiníveis, não conseguem destruir a tolerância e festa brava que bombeiam a alegria da festa. G. e os seus guppies, malta da Portucalense anterior a mim e caloiras que praxei, muitos trintões meus conhecidos, amigos e amigas de longa data que já não revia em lugar algum. Dir-se-ia que se mergulha no passado, num presente sem preocupações no futuro. É carpe diem no seu mais belo fulgor e com gente deixando-se viajar nas emoções do momento.

Viva la vita!

Na época natalícia que passou não posso afirmar que foi uma época muito especial e repleta de felicidade. Mas não se trata de finalmente ter descoberto que o Pai Natal é uma grande patranha e que quem o vestiu e promoveu como ícone desta altura do ano tão especial foi a Coca-Cola Company. Provavelmente a MacDonalds, ainda não existia na altura, senão poderíamos ter os palhaço Ronald a descer pelas chaminés dos meninos em todo o mundo para distribuir presentes e os patéticos oh-oh-ohsss.

Mas não odeio o estilizado velhinho barbudo (que pode até estar relacionado com o escandalo da Casa Pia), nem as suas renas amestradas e o resto do freak show que inclui duendes no Circo do Pólo Norte. A tenda é outra e não posso defender que o Equinócio de Inverno não me afecta. Nota-se o calor humano, o reencontro de famílias e amigos, a palavra da paz e esperança transbordam e espalham-se pelo povo católico.
Há sempre uma esperança, mas que é transporcada e estripada pelo consumismo desenfreado e pelos seus apelos circunstanciais, as solicitações de última hora.

As prendas, as prendas, as prendas e mais prendas. Os $ifrões, os $ifrões, os $ifrões e mais $ifrões. As compras, as compras, as compras e mais compras.
Parece que tudo se resumiu a isso. E nada como pensar desta maneira algo lúcida para se mergulhar numa revolta contida numa apatia invernal. Venha o próximo s.f.f. Em Novembro de 2003 temos mais.

Mas a canção do Natal não tinha apenas uma letra que falava de misérias humanas.
Houve um ou outro verso que fugia ao refrão. Deram-se dois grandes jantares da praxe, com amigos que estão muitas vezes perto do coração mas longe da vista. A um deses jantares tive o infortúnio de calhar no mesmo dia que a D.Deolinda faz anos, o que me fez chegar só para a sessão de anedotas. O outro foi uma orgia digna do deus Baco. Dizem as crónicas que ele agora anda disfaçado de menino Jesus e os três Reis Magos são as concorrentes a Miss Playboy Portugal… N. até consegui embater nos 130 cavalos ao sair da garagem da vivenda, que obrigatoriamente o inspector P. e Q. queriam investigar.
Era preciso ver que já tinham sido 6 botelhas e as meninas tinham um bilhete a avisar que chegavam só às 4 da matina. Escusado será dizer que estive mais morto que vivo no dia seguinte no escritório.

Depois o Nokia começou a tocar, a apitar. Parecia parvo, debitando telefonemas e SMS´s a torto e a direito de old friends, alguns deles que até já não tinha contacto. Ví-me a dar cabo do meu saldo também. Era a febre que eu também adiro com facilidade. E também ví o meu irmãozito depois de uma longa ausência sem dizer água vai. Como é costume fez umas borradas e tem as suas crises de consciência, saindo da sua Cuba adoptiva para regressar a República por uns dias. Foi uma boa prenda de Natal! E as mensagens das gajas também! Especialmente de…

E depois, o ano aproxima-se do fim. Mas isso é uma outra história.

A preguiça, o cansaço, o stress – e as doces loucuras tem afastado esta alma penada das suas reflexões. Mesmo assim tento hoje repor alguns fotogramas das últimas semanas.

Parte I – Melros e Afins

O sol não cumpriu a sua promessa e mais uma vez não me pude deliciar de papo para o ar… S.Pedro este ano está um estupor verdadeiramente sádico. Durante a semana transporca-nos com calor insuportável e Sol e ao fim de semana toma lá céu nublado.

Algumas pontas soltas que ensombravam o trabalho quase me tiraram o sono. Eram rajadas de stress injectadas nas veias logo de manhã cedo e cujo efeito durava até as 7, altura em que o meu cérebro preferia jogar ao iô-iô emocional e recusava-se a desferir mais de que um pensamento de 5 kb por hora.

O sofá e a TV eram só um pronuncio para um adormecer rápido a ver uma treta qualquer… !! Take 2 ! Take 3! Take 4! Take 5! Que semana estúpida!

Em raiva o clube “Groumet” foi mudar de ares para o “Solar dos melros” mas não ficou convencido. Mesmo assim a conversa foi aprazível e até profunda. Não muito matcho e bastante sincera. E onde ir depois?

Surpresa das surpresas no TX – uma madrilena arrebentava a escala mostrando que kitten ñ estay solo.-Se Dr.P. não tivesse armado um esquema pouco próprio com umas chavalas, teríamos lá ficado muito para além das 5! E lá tivemos que ir até ao Estado Negro. Pra variar deixou o telemóvel no carro do N.! 

Domingo foi comatose total! Só me levantei quase quando o dia se punha… Felizmente havia o feriado. Conversa de café com M. em apuros com a tubagem (pobre moço). Gasto com os amigos… ou melhor aproveitado.

Nos dias que correm é difícil ter ideias.
A nossa sociedade apenas promove uma crítica não construtiva como única forma de pensamento próprio.

É como se toda a minha geração fosse constituída por críticos de cinema algo estereotipados que apenas conhecem os filmes que ganharam os Óscares nos últimos 20 anos.
A cultura geral está baseada na TV e nos Shops, onde se discutem e criticam pessoas e locais antes de debater ideias e/ou aspirações. É o “eu” supérfluo e raramente o “nós” comunidade. Mas não sou muito diferente em última análise: – também eu sou consumista.

Moi memme que falo assim, gosto – quer queira, quer não – de consumir a máquina artificial de sonhos que nos espetaram pelo cérebro dentro, desde tenra infância através da TV. Esquecer aquilo que nos foi incutido desde o berço é como desprogramar a mente.

Basta-me um pouco de pensamento próprio. – Já sou feliz assim! Não vou ser mais feliz ou realizado com um apartamento classe média, um carro classe média, uma mulher classe média, um televisor classe média, amigos classe média, férias classe média, roupas classe média, um DVD classe média, livros classe média… enfim uma vida classe média que no fundo é uma ideia que a publicidade – essa religião da iconografia consumista nos ensinou e nos preparou para a acreditar que seria aquilo que queríamos ter para sermos felizes.

Fomos ensinados a ser medianos-classe média …

Mas hoje já não acredito nisso.

Falabella!

“Em alguma outra vida, devemos ter feito algo de muito grave, para sentirmos saudade

Trancar o dedo numa porta dói. Bater com o queixo no chão dói.
Torcer o tornozelo dói. Um tapa, um soco, um pontapé, doem.
Dói bater a cabeça na quina da mesa, dói morder a língua, dói cólica, cárie e pedra no rim.
Mas o que mais dói é a saudade.
Saudade de um irmão que mora longe.
Saudade de uma cachoeira da infância.
Saudade do gosto de uma fruta que não se encontra mais.
Saudade do pai que morreu, do amigo imaginário que nunca existiu.
Saudade de uma cidade
Saudade da gente mesmo, que o tempo não perdoa. Doem essas saudades todas.
Mas a saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama.
Saudade da pele, do cheiro, dos beijos.
Saudade da presença, e até da ausência consentida.
Você podia ficar na sala e ela no quarto, sem se verem, mas sabiam-se lá.
Você podia ir para o dentista e ela para a faculdade, mas sabiam-se onde.
Você podia ficar o dia sem vê-la, ela o dia sem vê-lo, mas sabiam-se amanhã.
Contudo, quando o amor de um acaba, ou torna-se menor, ao outro sobra uma saudade que ninguém sabe como deter.
Não saber mais se ela continua fungando num ambiente mais frio.
Não saber se ele continua sem fazer a barba por causa daquela alergia.
Não saber se ela ainda usa aquela saia.
Não saber se ele foi na consulta com o dermatolgista, como prometeu.
Não saber se ela tem comido bem (por causa daquela mania de estar sempre ocupada), se ele tem assistido às aulas de inglês, se aprendeu a entrar na Internet e encontrar a página do Diário Oficial, se ela aprendeu a estacionar entre dois carros, se ele continua preferindo Skol, se ela continua preferindo suco, se ele continua sorrindo com aqueles olhinhos apertados, se ele continua cantando tão bem, se ela continua adorando o Mac Donald’s, se el continua amando, se ela continua a chorar até nas comédias.
Saudade é não saber mesmo!
Não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos, não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento, não saber como frear as lágrimas diante de uma música, não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche.
Saudade é não querer saber se ela está com outro, a ao mesmo tempo querer.
É não saber se ele está feliz, e ao mesmo tempo perguntar a todos os amigos por isso…
É não querer saber se ele está mais magro, se ela está mais bela.
Saudade é nunca mais saber de quem ama, e ainda assim doer.
Saudade é isso que senti enquanto estive escrevendo e o que você, provavelmente, está sentindo agora depois que acabou de ler.”

Miguel Falabella –

Os amigos de Alex… ou quase

Este fim-de-semana está a ser pantagruélico e não tenho memória de tantas refeições ecuménicas em carteira.

Sexta-feira foi um dia penoso de trabalho, como alias são quase todas as Sexta-feiras quando não se trabalha ao Sábado de manhã. Mas ao Jantar reuniu-se a velha guarda das férias da adolescência. Para me relembrar que esses tempos, já são longínquos no tempo e na memória, nada como saber que B., o ás do secador verde-alface kitado para 62,5 C.C. roda da frente no ar levantada, é agora um feliz papá de uma saudável menina de 3960 gramas.

O Inspector P. meu inseparável da época da caça grosa e mangueiradas labrugenses, agora selecto agente do Sr. Director Geral, que me arrastava no passado para penosas encrencas, abala agora para a grande cidade onde por um largo período vai ser formado como investigador.

Quem diria que o moço que conheci há 15 anitos (mais as suas irmãs boazudas), será também ele papá dentro em breve. Aquele mulherengo incondicional e “casanova” desmesurado, usa agora crachá e tem sempre à mão uma beretta. Inspector P. e eu éramos e somos inseparáveis, só que agora não tanto no que toca à má vida e noitadas. Mesmo na nossa pior fase do “semi-delinquente”, em que partíamos lampiões e roubávamos placas de transito aos sábados à noite para desviar o transito de Domingo, eu e ele sempre alimentamos respeito um e uma enorme cumplicidade.

E recordo-me como se fosse hoje, quando B. obstinadamente alcoolizado queria «mandar ao soalho aqueles f.. da p…», ou seja derrubar três motociclistas que passavam nas suas Zundapps escape de alto ronco enquanto, eu o Inspector P. o tentávamos agarrar, a custo… O rapaz estava possesso e quase que tivemos que o mandar para o chão para segurar. O curioso é que um dos «mokotos» se mandou e raspou mesmo o soalho todo. Depois foi uma pacifica conversa de como «kitar» motorizadas com o sujeito ainda no chão com as jeans rotas do espalhanço… enfim… Velhos tempos.